Convocamos a palavra escrita sob a luz do pensador, Eng. Roberto Carneiro, que no estudo intitulado «2020: 20 Anos para Vencer 20 Décadas de Atraso Educativo - Síntese do Estudo» nos deixa um panorama dos desafios educacionais a enfrentar nos próximos anos... Vamos publicar, nos próximos dias, excertos do Capítulo III, Seis temas canónicos.
. - . - . - . - . - . - .
1. Os Portugueses e os Saberes
«Imaginar a educação do futuro é indiscernível de reflectir sobre a relação entre os portugueses e os saberes.
Essa foi sempre uma relação de ternura e de veneração, mau grado as vicissitudes políticas da história.
A detenção de saber certificado funcionou invariavelmente como bilhete de entrada para os escalões superiores da pirâmide social. O imaginário familiar projectou, de geração em geração ambições e esperanças na educação dos filhos e dos netos. A estratificação das estruturas ocupacionais reservou os melhores empregos para os mais sonantes diplomas, não necessariamente para os empregados mais meritórios. A função pública é ainda o espelho arcano da prevalência do diploma - "canudo" na linguagem vernacular - sobre a avaliação de mérito. A sociedade estatutária reproduziu rendas continuamente elevadas para a minoria detentora de saberes certificados cuja erosão só é possível numa sociedade meritocrática.
A oportunidade perdida na juventude só seria susceptível de ser recuperada na geração seguinte, salvo honrosas excepções. gerações sucessivas de portugueses aceitaram submissamente essa fatalidade, sem vislumbrar alternativa.
A verdade é que os próximos 20 anos vão ter de operar uma radical modificação neste entendimento estático sobre a educação. Há uma revolução a operar na mentalidade das pessoas e na cultura das organizações.
A educação vitalícia é sinónimo de uma escola à conquista de novos públicos, de uma universidade que capricha em acompanhar os seus diplomados ao longo da vida pessoal e profissional, da construção de um sistema aberto e flexível - com múltiplas entradas e saídas - que faz da proximidade e da articulação com a vida real um factor permanente de auto-renovação.
Vista pelo lado da pessoa que aprende, a educação vitalícia representa, no mínimo, quatro desafios conjugados concretizados nas capacidades de:
- Extrair conhecimento da informação.
- Construir sabedoria a partir do conhecimento.
- Compreender o esplendor da vida contido no viver.
- Fruir p prazer de aprender na partilha e na comunicação.
A relação saberes-conhecimentos-competências é dinâmica. Ela tem lugar em instituições educativas que se transfiguram em unidades de ensino em centros de aprendizagem inter e multigeracional. As escolas e universidades são, elas próprias, organizações aprendentes e os professores aceitam o desafio de liderar a sociedade que aprende em continuidade.
A investigação levada a cabo ligando tendências mundiais e europeias às novas exigências de competências necessárias e de perfis profissionais desejáveis é muito elucidativa. A mudança em curso, quer na organização do trabalho, quer no funcionamento das sociedades demanda aptidões de adaptação e de inovações cada vez mais críticas. (...)
Num contexto de saberes digitais e de novas competências criativas, cada personalidade é estimulada a conquistar a sabedoria das sínteses e a buscar o sentido das coisas. Os saberes codificados vão de par com os saberes tácitos. A dignidade do aprender fazendo é plenamente reconhecida e acreditada.
No decurso das próximas décadas todos os que evidenciam potencial de aprendizagem são encorajados a transformá-lo em acto educativo, sem limitação de condição ou de formação inicial. O sistema empenha-se na reabilitação de gerações abandonadas. Mediante a expansão da auto-estima e confiança dos seus membros - principalmente dos que foram objecto de mais extrema exclusão - superar-se-ão traumas escolares e possibilitar-se-ão novas aprendizagens.
A educação vitalícia é a alavanca para o conseguir.»
Carneiro, Roberto (2000), «2020: 20 Anos para Vencer 20 Décadas de Atraso Educativo - Síntese do Estudo»
in:O Futuro da Educação em Portugal Tendências e Oportunidades - Um estudo de reflexão prospectiva, tomo I, Lisboa: ME,
pp 38-40.
pp 38-40.
Sem comentários:
Enviar um comentário